Declarações do presidente geram controvérsia e expõem divergências sobre enfrentamento ao crime organizado
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva classificou como “desastrosa” a Operação Contenção — ação conjunta das forças de segurança do Rio de Janeiro que, no fim de outubro, resultou na morte de 121 pessoas, incluindo quatro policiais. A declaração, dada nesta terça-feira (4), em entrevista a agências internacionais, reacendeu o debate sobre o papel do Estado no combate à criminalidade e levantou críticas sobre a postura do governo federal diante da escalada da violência nas comunidades dominadas pelo tráfico.
“O dado concreto é que a operação, do ponto de vista da quantidade de mortes, as pessoas podem considerar um sucesso, mas do ponto de vista da ação do Estado, eu acho que ela foi desastrosa”, afirmou o presidente, ao defender a realização de uma investigação independente. “A ordem do juiz era de prisão, não de matança, e houve uma matança.”
A fala de Lula foi vista por parte de especialistas em segurança como um gesto de deslegitimação do esforço das polícias estaduais na tentativa de conter o avanço do Comando Vermelho (CV), facção que há décadas impõe medo, domina territórios e age como um verdadeiro cartel do crime no país. A operação, que mobilizou 2.500 agentes, foi a mais letal da história do Rio de Janeiro e tinha como alvo os principais líderes do grupo, responsáveis por coordenar ataques armados e o tráfico em diferentes comunidades.
O governador fluminense, Cláudio Castro, defendeu a ação, afirmando que “todos os criminosos que se renderam foram presos” e classificando o resultado como “um sucesso”. Já o governo federal sinalizou apoio a uma apuração paralela, sob justificativa de “garantir transparência e responsabilização”.
Direitos humanos e o direito à vida dos inocentes
As críticas do presidente contrastam com o sentimento de parte da população brasileira, que vê nas operações policiais um último recurso contra o domínio do crime organizado. Pesquisas recentes mostram que cresce o número de brasileiros favoráveis à tipificação das ações de facções como terrorismo, justamente pela forma como essas organizações agem — impondo toque de recolher, controlando comunidades inteiras e aterrorizando moradores e comerciantes.
Analistas avaliam que, ao adotar um discurso voltado mais para a pauta dos direitos humanos, o governo corre o risco de se distanciar da percepção social de urgência por segurança e ordem. “O crime organizado não apenas desafia o Estado; ele o substitui em muitos territórios. Equiparar essas ações a terrorismo seria um passo simbólico e jurídico importante para recuperar o controle e a esperança”, avalia um pesquisador de políticas criminais ouvido pela reportagem.
Enquanto Lula participa, em Belém, dos preparativos para a COP30 — conferência global sobre mudanças climáticas —, o tema da segurança pública volta a dividir opiniões no Brasil. De um lado, a cobrança por investigações independentes. De outro, o apelo de milhões de brasileiros que se sentem reféns de facções que, há anos, agem com a mesma brutalidade de grupos terroristas.